segunda-feira, 26 de janeiro de 2015

Henrique Oswald (1852-1931) e Leopoldo Miguez (1850-1902) por Braz Velloso


Duas gravações de relevância no contexto dos 450 anos do Rio de Janeiro

O pianista brasileiro Braz Velloso, radicado em Paris, lançou duas gravações pela Naxos, respectivamente com obras de Henrique Oswald e Leopoldo Miguéz, que podem ser consideradas entre as mais significativas produções artísticas e de pesquisa musical aplicada do presente. Elas adquirem especial relevância no contexto das comemorações dos 450 anos do Rio de Janeiro. Ambos os CDs incluem pormenorizados textos de Sérgio Bittencourt Sampaio. Atenção merecem as imagens do Rio de Janeiro  de pinturas de Rosalbino Santoro (1884) e de Arthur Thimóteo da Costa (1918) na página-face das gravações, obras da coleção Fundação Sergio Fadel.

Braz Velloso iniciou os seus estudos no Conservatório Brasileiro de Música, tendo tido como professores Homero Magalhães, Lucia Branco e Estela Caldi. Entre 1972 e 1974 tomou parte nos cursos internacionais da Pró Arte em Teresópolis. Transferiu-se para Paris em 1975, passando a ter aulas com Monique Deschaussées e posteriormente com Marian Rybicki na Ecole Normale de Musique. De 1980 a 1985 participou de master-classes de Monique Déchaussées em Barcelona e de Leon Fleisher e Magdalena Tagliaferro (Veja) em Paris. As suas atividades de solista e em conjuntos de câmara são intensas, tendo-se apresentado no Brasil e em diversos paises europeus. Concebeu eventos que incluem piano, texto e dança, apresentados em várias cidades do Brasil e em Paris.

O CD Henrique Oswald Piano Music (Naxos 9.70200), produzido na Alemanha, foi gravado Igreja Evangélica Saint Marcel de Paris, em junho de 2012. Êle inclui as obras Six Morceaux op. 4 (ca. 1867), com Waltz, Réverie, Menuet, Berceuse, Barcarolle e Impromptu; Trois Romances op. 7; Il Neige; Six Pièces op. 14, com Berceuse, Mazurka, Tarantelle, Barcarolle, Nocturne e Scherzo, e Feuilles d‘Album, op. 20, com Inquiétude, Chansonette, Feux follets e Désir ardent. 

Não só as qualidades da sua realização das obras, como também a própria produção visual e de conteúdo dos CD's testemunham excelência técnica, além de grande sensibilidade e atenção  à captação do espírito da época.

Contribuição ainda maior aos estudos musicológicos de orientação cultural relacionados com o Rio de Janeiro é a gravação dedicada a obras para piano de Leopoldo Miguéz. (Naxos 9.70199) 

Nesse CD, gravado na Igrreja Evangélica de Saint Marcel de Paris em novembro de 2011, produzido por Nikolaos Samaltanos e editado por Evi Eliades, o pianista inclui várias peças do compositor gravadas pela primeira vez. O CD inclui Souvenirs, op.20 (Nocturne, Mazurka, Scherzetto, Lamento); Scênes intimes, op. 24 (Berceuse, Chanson d‘une jeune fille, Conte Romanesque, Bavardage); Faceira (Valse-Impromptu) op. 28; Morceaux lyriques, op. 34 (L‘Improvisateur, Saudade, Pologne, La Mendiante, Plaisanterie); Nocturne, op. 10 e Allegro appassionato, op. 11.  

O significado dessa realização de Braz Velloso e das obras gravadas apenas pode ser avaliado adequadamente considerando-se o debate de décadas que vem sendo desenvolvido em meios especializados no âmbito das instituições, eventos e cursos universitários voltados às relações entre o Brasil e a Europa. 

Se Henrique Oswald foi considerado em conferências/concertos e simpósios - entre outros na Semana França/Alemanha/Brasil do Forum de 1982 - Leopoldo Miguéz tem recebido ainda maior atenção devido a seus estreitos elos com desenvolvimentos alemães. Estes, porém, inserem-se em contextos internacionais da época, devendo ser considerados na complexidade de suas interações e múltiplas dimensões, em particular também político-culturais. 

A consideração de sua obra não é apenas de significado para o Brasil ou para a difusão da música de compositores brasileiros na Europa, como também para a própria pesquisa músico-cultural na Europa no âmbito dos esforços de desenvolvimento de uma musicologia histórica que procura superar posições convencionais delimitadas geograficamente e ampliar-se através de perspectivas teórico-culturais. 

Essas amplas dimensões de significados recíprocos foi considerada entre outras ocasiões quanto à problemática wagneriana nas suas relações com o Brasil e na sua recepção francesa por ocasião dos 100 anos da Casa de Festivais de Bayreuth em 1976 (Veja), no contexto do projeto de recepção musical no Brasil em 1979/80 e em simpósios sobre as influências recíprocas entre a Europa e a América Latina das Comunidades Européias entre 1983 a 1985. Essa consideração da reciprocidade em processos receptivos teve repercussões em trabalhos universitários voltados à Escola Nova Alemã nas suas dimensões internacionais, em particular no concernente ao Poema Sinfônico e suas expressões no continente americano. 

O significado - e a problemática político-cultural - da obra de L. Miguéz esteve sobretudo no centro das atenções em concerto camerístico e sessão acadêmica realizada na Alemanha sob o patrocínio da Embaixada do Brasil em 1999, preparando o Congresso „Música e Visões“ (1999) do triênio pelos 500 anos do Brasil. 

A realização sonora das obras para piano de H. Oswald e  L. Miguéz nesses CDs de Braz Velloso representa assim, não só pela sua excelência interpretativa, uma contribuição de extraordinário significado não só para o desenvolvimento dos estudos especializados. Essas gravações merecem ser consideradas com especial atenção em ano de comemorações do Rio de Janeiro, pois oferecem um caminho sonoro à compreensão do universo cultural que marcou os anos de reconfiguração da antiga capital do Brasil, projetando-a no Exterior como um modêlo de evolução e marcando a imagem do país.


Antonio Alexandre Bispo

Indicação bibliográfica para citações e referências:
Bispo, A.A..“Henrique Oswald (1852-1931) e Leopoldo Miguez (1850-1902) por Braz Velloso.“ Revista Brasil-Europa: Correspondência Euro-Brasileira 153/17 (2015:01). 


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